Ontem na padaria conheci um homem que me fez lembrar o que disse Fernando Pessoa sobre a loucura humana.
"A loucura, longe de ser uma anomalia, é a condição normal humana. Não ter consciência dela, e ela não ser grande, é ser homem normal. Não ter consciência dela e ela ser grande, é ser louco. Ter consciência dela e ela ser pequena é ser desiludido. Ter consciência dela e ela ser grande é ser génio."
Era um homem de aparência normal, cabelos grisalhos, olhos bem azuis e muito sério. Reparei nele porque ele ficou me olhando fixo e fiquei preocupada porque fiquei imaginando se eu havia tomado o lugar dele na fila, a fila se estendia em duas direções, ele então saiu do lugar dele na fila e parou do meu lado, então tive certeza que havia tomado a vez dele, mas não... ele queria conversar, e começou me falando da ineficiência do atendimento no Brasil, eu sorri por educação, mas o homem continuou à falar e foi uma enxurrada de doideiras. Disse que era filho de italiano com alemão, dono de uma empresa bem sucedida, professor na USP, cientologista e que por tudo isso estava invisível, à princípio tive vontade de rir, mas depois me deu pena. Ele falou muitas coisa interessantes e realmente conhecia algo sobre cientologia, mas eu não estava muito à fim de conversar e portanto assim que tive chance saí pela tangente, mas depois ele me alcançou no caixa e retomou a conversa, fui bastante fria com ele e fui embora.
No entanto, quando estava me sentindo segura no carro, fiquei olhando o homem se afastar e senti remorso, há tão pouco tempo eu estava me lamentando por não ter dado atenção àquele andarilho que morreu em um ponto de ônibus e ontem fiz a mesma coisa, pior até. Não era um pobrezinho, era um homem bonito, bem vestido e normal na sua loucura, e acima de tudo era uma pessoa querendo conversar, querendo um pouco de atenção. E mais uma vez eu perdi a oportunidade de ser útil à alguém.
Agora vou mais vezes àquela padaria pra ver se encontro aquele homem. E se encontrar, vou parar pra escutar e quem sabe, trocar idéias.
Só espero que ele não saia jogando pedras na lua depois de conversar comigo.